segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Wassily Kandinsky (1866-1944): Linha Transversa, 1923

Madame Bovary: a produção dos extremos



Madame Bovary é um texto ímpar na história da literatura ocidental. Escrito e publicado em meados do século XIX, o romance de Gustav Flaubert dispensa apresentações, sendo uma das evidências mais contundentes das maravilhas que o gênio literário pode criar. Partindo de um enredo do qual, à primeira vista, só poderia sair algo medíocre, Flaubert consegue engendrar umas das tramas mais brilhantes da literatura e ainda fazer uma análise extremamente preciosa da sociedade e principalmente dos valores da burguesia nascente. Além de tratar-se de um retrato da frança provinciana da época, o livro é um ótimo remédio contra o as idealizações românticas que ainda hoje impregnam o olhar dos leitores mais desatentos. Flaubert promove em Madame Bovary a demolição do romantismo para, sobre seus escombros, construir um obra magistral. Quando me decidi a ler o volume (razoavelmente denso, umas 400 páginas) não esperava encontrar algo que pudesse impressionar-me tanto. Mas como sempre, os clássicos nos esmagam. O livro se inicia com uma atmosfera entediante e vai tomando corpo até que chega um momento em que é absolutamente impossível parar de lê-lo. A construção dos personalidades é lenta e linear, vamos os conhecendo página a página ao longo do livro, sob os auspícios de uma narração sutil e ao mesmo tempo sagaz. O livro é uma aula de estilo. Há um constante desenvolvimento na complexidade de cada personagem ao longo do livro, nem um deles é constante ou virtuoso. Começamos amando os que terminamos odiando e começamos odiando os que terminamos amando. Emma Bovary, a personagem central, que em meados do livro começa nos despertar um certo desprezo por seu excesso de volúpia e ao mesmo tempo de ingenuidade, caminha , ao final do romance, para um personagem grandiosamente trágico. O farmacêutico Homais que, à primeira vista, desperta uma certa simpatia com suas críticas ao catolicismo e seu elogio da razão acaba, depois de certo tempo e pelos mesmos motivos que antes despertaram simpatia, tornando-se um dos personagens odiosos de toda a literatura. O mesmo acontece com todos os outros personagens, entre eles, Charles Bovary que se revela um grande homem (a vontade que se tem ao final é de abraçá-lo e chorar com ele) e Léon ,o jovem de aspirações românticas que acaba por se render à segurança da vida burguesa . A grandiosidade de Madame Bovary está em sua capacidade de fazer com que o leitor inicie sua leitura com um sorriso de escárnio e termine-a com lágrimas nos olhos.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Para alguém que me entenda.

Me espere só um segundo,
Só pra ver como dói a sinceridade,
E como é verdadeiro aquele olhar que te dirigi.
Como pode ser perfeito o ideal,
Ideal de dor que persegue a nós dois, moça.

Queria ter coragem para lhe mostrar esse seu mundo,
Mundo de fugas, de aparências cultivadas.
Que queres tu, com a tua modernidade,
És, na verdade, menos contemporânea a cada dia
Bêbada como hoje, mas conformada como ontem.

Pensa um pouco mulher, como pode ser?
Queres guiar? Então, guia!
Mas pensas antes de me beijar, e,
Se calhar, morda-me o lábio até sangrar.

Desse modo saberei o que você realmente deseja.
Retira-me a sanidade de uma vez!
Bata-me na face, corta-me a garganta,
Por favor! Se não for assim, eu não aceito.

Deustino

O que achas que pode contra mim, meu senhor?
Não és tão grande quanto lhe atribuem os tolos,
Em nada és forte, teu culto já não existe em meu mundo
Queres deixar-me em maus lençóis mas, desconheces minha natureza
A fundo, és tão podre, se baseia apenas no infundável de minha vida
Sou imoral porque posso sê-lo, não me dizes nada sobre o que posso,

Sou surdo a seus esforços, não me puxe com o seu braço maldito.
No meu mundo não há musa e não há moira, entendes?
O meu mundo é dos homens factíveis, dos reais.
Dos viciados, dos imorais, esses são a minha imagem e semelhança.
Não é você que só não morre por não existir! Malditos sejamos nós!

Contraditórios em nossas preces
Somos seculares diante do divino
E divinos diante do secular.
Atenção!
Sejamos humanos!
Só isso deve ser respondido,
Diante de todas as perguntas
Afinal de contas, que mais nos resta.

Sou o que sou, amaldiçoado ou não.
E que me importam as maldições?
Todas frutos de perversões de nosso olhar
que faz o possível pra se desviar daquilo que é evidente.
Senhor destino, lhe reservo um beijo frio
O beijo daquele que sabe que nada mais é possível diante da sua figura.
Figura que já há muito não é pintada.

Rubros olhos...

Sábado às dez pras quatro da manhã
Só me resta a última dose da garrafa de conhaque
Uns vagos pensamentos sobre as coisas que deveria ter feito
Mas, em contrapartida, muito do rubro de seu cheiro.
A comoção me invade,
fico pensando no silêncio que nossas poucas palavras fizeram

Fico imaginando teus olhos que ainda brilham diante dos meus
Brilham raros, não são olhos que se dêem ao desfrute
E por vezes, se recusam, sublimes, a olhar.
Como poderia ser diferente, meu deus minúsculo?!
Isso me proporciona mais um gole de angústia.
O que devo esperar?

Não sei se fiz a mais ou a menos,
sei que fiz o que pude, e,
poder pouco é muito comum!
me desacostumei das palavras,
sentir me causou esterilidade verbal.
somente aos olhos e aos ouvidos cabem minha felicidade.
E se sinto é só por uma vontade que me escapa ao controle.

O problema,
É que,
Diante
Dessa face
Rubra,
Só me resta,
Abandonar
A razão.

Não poderia fazer nada além disso,
a vontade quer chegar à potencia.

Anaesthesis

The show must GO on
E eu nem sei pra onde vai, se é que vai
Mas é aí que vem a certeza do incerto
A justeza do incorreto, a ética da transgressão
É nesse ponto que bate a saudade
Dos tempos em que ser humano era descomplicado
Onde suas palavras só diziam o que diziam
E não havia hermenêutica capaz de subvertê-las
Mas, houve um tempo assim?

E eu nem sei como, se é que há jeito
Como poderia haver algo além de nós
O nós do agora, o do ontem, já não sei...
O do amanhã, eu duvido muito...
Porque haveria, também, de me preocupar com o amanhã?
Já me basta a incerteza do agora.
Turbilhão de sentimentos que nem parecem ser o que são
E talvez nem o sejam mesmo.
E que certeza é sensível?

Tenho andado confuso, perder o chão é fácil
O problema é ter que estar segurando os pavimentos
Essa construção que nem lógica tem!
Tenho nas mãos os sustentáculos de um conjunto vazio
Os julgamentos de um nobre, os hábitos de um burguês, as condições de um miserável.
Dá pra acreditar?!?!
Só poderia fazer algo que me dispensasse daquilo que pretende o mundo.
Nada, na verdade, era isso que eu gostaria de ter
Uma posição de observador, um deus nada poderoso
O sábio da vida comum, reprodutiva
Nada produtiva, sem métrica e sem lógica, como esse poema
Que eu nem sei se é poema, confissão, desabafo ou profissão de fé
Profissão de fé na descrença, só se for!

Queria poder rimar e dizer coisas belas, realmente interessantes, mas agora...
Agora ficarei mesmo é com essa anaesthesia
Geral! Dormência, desinteresse, desgosto, desdém...
Não quero nada além daquilo que não posso ter
Poema régio, José! de dores e ambigüidades
Vacilações sublimes, bipolaridade, tensão...

But, the show...
Fechem as cortinas, já é tempo!
Estou tão fragmentado hoje que deveria começar a andar por aí, me catando pelo chão.
Quem sabe no fim eu não encontro alguém?
Waiting for the warms or the wars. That’s all!

MORTUÁRIO

Se querem me matar, que o façam logo!
Não perguntem o modo, não me perscrutem
Não direi uma única palavra a respeito disso, de nada.

Não lhes darei dicas sobre a minha forma de minguar
Acabarei através da surpresa, pela criatividade de vocês
Sem saber que acabo ou que já não existo.

Não me farei morrer como imagino,
Minha mortalha está já reservada para todos visitarem
Descansarei como sempre, mas com um detalhe - será o descanso de um humano.

Saibam que mesmo sem encostar em mim
Entendo o que dizem, me encurralam em seus olhares
Me dão a força daquele que será reprovado sempre

Do rebelde, que não se curva diante de um amor insosso
De quem precisa de mais, de quem quer sempre ir além
Fazer-se junto, e mais, fazer-se homem.

Vocês podem até conseguir me enquadrar, me moralizar,
Fazer-me curvar, mas isso será uma morte, a morte que vocês não planejaram.
A minha morte, essa não é assim – é humana!

Me recuso terminantemente a cumprir regras,
Não firmarei acordos, não serei partidário de vocês,
Serei humano até o fim!

sábado, 3 de janeiro de 2009

Deita

Deita-me à tua sombra mulher
Finge que por ao menos um mínimo instante fui teu

A verdade é que olhos ao olhar pra teu semblante
Viram apenas o que estava oculto,
se preocuparam tanto com as profundezas
que se esqueceram da superfície

Deixe-me descansar em teus braços,
Faz um esforço em pensar que assim permanecerei

Eu nunca te quis olhar como olhei,
Nunca te quis ver como vi, mas desnudo já desde tão cedo...
Não tive escolha, e hoje, agora
Não sou nada além de um já passou.

Deixe-me fingir-te a felicidade uma última vez,
A felicidade que nunca alçou vôo sobre a minha cabeça
A felicidade que por não ser ave de rapina nunca se interessou
Na minha carne sempre a mostra, carne que já nasceu decomposta

Deixa eu te dar um último olhar,
aquele que persegui a minha vida inteira
o olhar despretensioso, de quem já chegou
de quem já cumpriu, de quem já gozou

depois disso, pode deitar-se à sua cova e,
então, fazer cumprir teu desejo, aquele
de sumir de minha memória, de sumir
com a minha memória, com a minha vontade de ti.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Entificação




















O que queres meu filho

Está tudo aí!

Transforma-te no que tu és

Hoje és todas as coisas,

Mas está tudo em ti

Não precisa ser as coisas

E o que são as coisas?

Sem ser o que és não há coisas,

Nunca há.

Sirva-se de mim e de você

Não das coisas

Não és uma delas

Tome-me em teus braços

Quem precisa dessa parafernalha,

Quem precisa das coisas?

Essas tuas forcas, falsas forças

Não são teu ser e nem o meu.

Victor Azevedo

Para Baudelaire


O rebelde não precisa de anjo que lhe force a amar o pobre, o aleijado, o leproso, pois ele já o faz naturalmente quando dirige seu olhar àqueles que se assemelham a ele. O rebelde é o aleijão desse mundo. Todos os outros são ímpios.


Victor Azevedo

Pensamento Metafísico

Hoje sou dono da minha própria metafísica!

Mas e se não houver deus?

Vou ter que me candidatar...



Victor Azevedo

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Imagem do mês de Dezembro de 2008


Van-Gogh : " Wild Flowers and Thistles in a Vase"

Poema do mês de dezembro de 2008 (Um poema de Antonin Artaud)






"Quem sou eu?
De onde venho?
Sou Antonin Artaud
e basta que eu o diga
Como só eu o sei dizer
e imediatamente
hão de ver meu corpo
atual,
voar em pedaços
e se juntar
sob dez mil aspectos
diversos.
Um novo corpo
no qual nunca mais
poderão esquecer.

Eu, Antonin Artaud, sou meu filho,
meu pai,
minha mãe,
e eu mesmo.
Eu represento Antonin Artaud!
Estou sempre morto.

Mas um vivo morto,
Um morto vivo.
Sou um morto
Sempre vivo.
A tragédia em cena já não me basta.
Quero transportá-la para minha vida.

Eu represento totalmente a minha vida.

Onde as pessoas procuram criar obras
de arte, eu pretendo mostrar o meu
espírito.
Não concebo uma obra de arte
dissociada da vida.

Eu, o senhor Antonin Artaud,
nascido em Marseille
no dia 4 de setembro de 1896,
eu sou Satã e eu sou Deus,
e pouco me importa a Virgem Maria.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Cantigas de invencionices permeiam o meu peito
Este urra, retumba, ecoa, parindo sentimentos
que dançam ao som dessas canções
Minhas costelas vibram com cada nota
Eis que torno-me escrava desse parimento
intermitente, convulso, incontrolável.

Já não caibo mais em mim...
Também quero virar canção
viajar junto ao vento
sorrir em cada rodopio
florear entranhas
sussurrar poesia em cada esquina.

Michele de Assis

O Noivo

Noivo de minha solidão espreito a um outro dia

Querendo ser mais do que ser, quero agonizar no gozo

O gozo da fortuna, do acaso, daquilo que ainda não é

Do que sou.


Gosto de ter entre os dedos a mais impura das águas

Aquela que desce dos céus de uma selva irrazoável, humana

Toda cidade me traz ao peito a angustia de minha solidão possível

Da minha companhia maculada, da TV que não assisto

Do que poderia ser aquele que não sou.


Quero saber da minha alma que anda perdida em meio às saias

Saias que pertencem às namoradas que não tive

E não tive por que não quis, nosso tempo foi adiado

Adiado pela comoção de uma poesia vadia, sem rumo


Vago em desvarios, como se não fosse pra ser

Mas é, e por ser já merece as reverências

Todas prestadas por quem não conhece o que conheço

Pelo que há de vário em ser

E pelo que há de absoluto em não ser.



Victor Azevedo

domingo, 2 de novembro de 2008

The Virgin of the Rocks , Da Vinci (novembro de 2008

As Águas do Rio (poema do mês de novembro de 2008)



As Águas do Rio

Bertolt Brecht*

Por mais que olhes o rio
Que corre pesadamente diante de ti,
Nunca verás as mesmas águas.
Nunca regressa a água que passa.
Nem uma só gota
Volta à sua nascente.


*Nascido Eugen Berthold Friedrich Brecht na Baviera, Brecht estudou Medicina e trabalhou como enfermeiro num hospital em Munique durante a Primeira Guerra Mundial. Filho da burguesia, sofreu, como todos em seu país, a sensação de desolamento de encarar um país completamente destruído pela guerra.

Depois da guerra mudou-se para Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para a apetência do público pelo teatro moderno. Já em Munique, as suas primeiras peças (Baal (1918/1926) "Tambores na Noite" Trommeln in der Nacht(1918-1920) ) foram levadas ao palco e Brecht conheceu Erich Engel com quem veio a trabalhar até ao fim da sua vida. Em Berlim, a peça Im Dickicht der Städte, protagonizado por Fritz Kortner e dirigido por Engel, tornou-se o seu primeiro sucesso. (wikipedia)

Leia mais

sábado, 25 de outubro de 2008

Negro Amor

Música de Bob Dylan ( "It's all over now (baby blue)"), versão em português de Caetano Veloso e interpretação dos Engenheiros do Hawaii. Muito bom

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Central Park West - John Coltrane


Eu nunca foi fã de Jazz, tenho de confessar. Mas após esta música tive de rever meus conceitos.
Sobre Coltrane: John William Coltrane (kōl'trān) - (Hamlet, Carolina do Norte, 23 de setembro de 1926 — Long Island, Nova Iorque, 17 de julho de 1967) foi um saxofonista e compositor de jazz norte-americano, comumente considerado pela crítica especializada como o maior sax tenor do jazz e um dos maiores jazzistas e compositores deste gênero de todos os tempos. Sua influência no mundo da música ultrapassa os limites do jazz, indo desde o rock até a música erudita. leia mais (fonte: Wikipedia).

Clique Aqui para baixar a música.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Fado


De meu fado farsante tal qual minha natureza enfadonha
Sonho com minha alma transfigurada em corpo
De subjetividade afinada em minha fome de objetividade
Causo sentir em caos de palavra arrebatada
De paixão em eclipse com revigorada mortificação
Faço de mim o feixe de lenha, ardente inação

Do cais mortuário ao porto secular
De minha morte acesa à luz de um grandiloqüente penar
Faço de minha mortalha a vívida miríade do pensar
Julgar de mim mesmo, passado e futuro ao presente que não é
Ao mundano que se oculte sob os lívidos fulgores de estar.


Poema - Victor Azevedo
Tela - Caravaggio

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Um Dalí nunca é demais

Como já dizia o velho Proudhon...


Sobre a experiência que ele, Pierre Joseph Proudhon, viveu como representante popular na Assembléia Nacional francesa.

"É preciso ter vivido neste isolador que se chama uma Assembléia Nacional para conceber como os homens que ignoram mais completamente o estado de um país são quase sempre aqueles que o representam."

sábado, 4 de outubro de 2008

Eleições 2008: "Esolha seu próximo algoz ou diga não a todos eles"


"Temos guardado um silêncio bastante parecido com a estupidez"
Eduardo Galeano

Estava pensando outro dia sabem...
Vocês sabiam que uma grande parte do congresso brasileiro é composta por grandes latifundiários, donos de universidades e empresários (ou representantes diretos destes)? Sendo assim, como podemos pensar em democracia? Porque, obviamente, a maioria da população brasileira não é proprietária de terras, etc, etc, não é mesmo?
Ou seja, o sistema político brasileiro não é nem um pouco democrático. Os interesses do estado não coincidem com os interesses da nação, ou do povo.
E, na minha opinião, votar é aprovar o sistema político vigente, e dar aval para essa farsa democrática. No fim das contas, é uma ditadura de uma minoria sobre a maioria do povo brasileiro, que nunca vê suas necessidades atendidas. E quem pode mudar isso além de nós mesmos?
Sabem, já repararam em como a mídia faz questão de colocar a culpa do fracasso e da corrupção da política brasileira na população? É a velha estória, a política vai mal por que o povo não vota com consciência. E isso é simplesmente absurdo. Seria bacana se o mesmo jornal nacional que proclama o “voto consciente”, definisse o que esta entidade metafísica significa. Talvez, seja apenas uma quimera...
A própria estrutura político partidária do país não permite que se vote conscientemente
A população não tem o menor controle sobre a política, não tem informação.
A propaganda eleitoral resume-se a seu próprio nome: “propaganda”. O principal objetivo é vender. E hoje em dia nem sequer querem vender uma ideologia, agora nos enfiam goela abaixo uma imagem tão vazia quanto uma novela das 8 . Um desfile de personagens exóticos que proclamam utopias e reformas, sem chegar a questionar acerca de quais são as demandas de maior prioridade, quais os problemas e, principalmente, qual a origem dos problemas. A propaganda eleitoral deveria deixar de ser propaganda. A política do país tem de deixar de ser tratada como mercadoria.
Enquanto me é vedada a possibilidade de votar conscientemente, fico com a única opção plausível para uma coerência trágica que julgo, talvez sem razão, ter: anular o meu voto e manifestar minha total descrença em um sistema político em que as decisões dos representantes do país são geralmente destinadas ao privilégio de uma minoria abastada, mais de estupidez do que propriamente de riquezas, em detrimento do resto, que enquanto não começar a gritar, continuará sendo o “resto”, apesar de ser a maioria, e a maioria, quando acorda, é capaz de mudar.

Poema do mês de outubro de 2008: A Dança


A Dança

Houve um tempo em que a vida dava-me um tapinha nas costas
E dizia: - vede este lugar maravilhoso? Eis o teu mundo.
Hoje a vida continua a dar-me um tapinha nas costas
Dizendo: - vede este lugar estranho e inóspito? Eis o teu mundo.
Ai de mim!
Por que é tenho cada vez mais pesar de ter que ir embora?

Obs: um poema meu, por que não?

Imagem do mês de outubro de 2008


Dia da flor de Diego Rivera, mais uma voz da américa...

domingo, 28 de setembro de 2008

À Sanidade - Pedro Corgozinho

Me pergunto se as pessoas com as quais convivi estão perdendo a humanidade, ou se sou eu quem o fiz, ou ainda se nenhum de nós nunca a teve e agora alguns de nós conquistam alguma subjetividade - a custo de muito sofrimento, claro. A subjetividade custa muito, muito mesmo. Normalmente ela custa a saúde de uma pessoa. Aliás, não deve ter sido sempre assim. Mas as coisas tem mudado com velocidade espantosa, e agora pelo menos é assim.
O fator humano está em falta. Não é fácil encarar o mundo de forma humana, ñão este mundo, pois se terá que engolir que o outro é de carne e osso e sofre e sente dor e morre, etc. Se já não é fácil viver sabendo-se humano, talvez seja aind amais difícil saber o outro humano. E isso tem muito que ver com a distância na qual vivemos.
Não nos enganemos, não brinquemos a respeito: a única distancia real é a desigualdade social, é a base material, é de ordem socio-economica. É por esta distância que estamos condenados a viver a sós, é esta a distância que se abateu sobre nós. Não que entre alguns de nós haja esta diferença, não, a maioria de nós tem base material parecidíssima. O fato é que a desigualdade social presente efetivamente, realmente, objetivamente no mundo (todos esses adjetivos e ainda há quem duvide, há quem recorra a idealismos capazes de colocar em dúvida a base material, capazes de especular sobre o capital e seu poder, enfim, é uma tristeza a leseira do mundo), ela basta para que todo o resto trunque. A sanidade é uma tarefa: é a tarefa de minimizar os efeitos dessa desigualdade nas nossas vidas. Ora, mas fazê-lo individualmente NÃO SIGNIFICA ABSOLUTAMENTE NADA, exatamente porque a diferença social não é subjetiva, não é um dado de um individuo, mas é dada por uma relação entre os individuos e, como tal, só uma relação entre indivíduos pode ter algum poder subversivo contra ela.
Não estou propondo uma militância, não estou fazendo um convite à comunhão de nossas vidas, não estou propondo que vivamos estéticas de grupo ou ainda que tentemos reviver movimentos lesados do passado, como pode parecer sugerir o assunto desse e-mail. Estou apenas considerando que a sanidade é uma tarefa. Que é uma tarefa difícil, que é ridículo pensar em sanidade individual, que solidão não "significa nada de significativo", ainda que estejamos todos vivendo pateticamente sozinhos e dessa condição não consiguimos escapar. A sanidade é uma tarefa que talvez dependa de uma mudança radical na ordem material das coisas. A sanidade é uma tarefa que eu não posso levar a cabo sozinho, que todos nós vivendo juntos não poderemos realizar, enfim: A sanidade é uma tarefa complicadíssima e eu espero que nessa altura da vida nenhum de vocês esteja pensando que vive dignamente ou de forma legitimamente humana; que nenhum de nós recaia nessas leseiras incríveis de querer ser ataraxicos, de suspender o juízo sobre a condição real e pateticamente miserável de nossas vidas, de achar que a cerveja e o beque sagrados são fumaça e sangue divinos da redenção individual ou coletiva. Espero que cada um de nós esteja sabendo de como estamos inseridos no ridículo de ser-quase-humano, que estamos constrangidos pelas condições reais materiais do mundo, PELA FALIBILIDADE DA CARNE, pela nossa incapacidade de levar a cabo a tarefa da sanidade e emancipar-nos a nós mesmos, visto que tal emancipação depende da emancipação de todo mundo, e não da emancipação do conforto de um apartamento, seja ele no centro, marajó, funcionários, santa efigenia, bom despacho, na puta-que-o-pariu. Que cada um de nós saiba que é feio, que o outro é feio, que é feio o mundo insano.
que ninguém confunda isso com um mea culpa, que ninguém seja cristão para além da conta. Se você ainda não apelou, está lendo até agora, saiba ainda que estou aliviado de estar dizendo tudo isso depois de uma grande garrafa de café e uma chuva maravilhosa que cai lá fora e mata mendigos de frio, resfriado. Que os ratos infectam a enxorrada na senzala do mundo.
Que a sanidade é uma tarefa!

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

espirais


E essa é a música que amo:

*ESPIRAIS* Depois do céu tem outro céu
Ou nem o céu existe mais?
Será que o sol é de papel?
Será que as nuvens são de gás?
Se o mar começa noutro mar
Quem é que tira o sal do sal?
Antes do dia começar
A noite é quase imortal.

Se nada tem um fim
Quem é que fez o não?
Se a nossa vida quer assim.

Eu viajei no tempo só por você
E me perdi no final
Quando encontrei seu olhar.
Nossos destinos desenhando espirais
Eu entendi o sinal
Pelo seu jeito de rir pra mim

Se existe outra dimensão
Em que você não é você
Quem é que sabe a direção
Pra encontrar quem não se vê?
Se o tempo sempre tem razão
E tudo sempre vai mudar
Pra que manter os pés no chão
Se todo mundo quer voar?

Se nada tem um fim
Quem é que fez o não?
Se a nossa vida quer assim

Eu viajei no tempo só por você
E me perdi no final
Quando encontrei seu olhar
Nossos destinos desenhando espirais
Eu entendi o sinal
Pelo seu jeito de rir pra mim.

Apenasmente Morre


Só Freud explica.

Só Jesus Salva.

Só o homem peca.

Só a fome mata.

Só a ilusão alegra.

Só a solidão sufoca.

Só os mortos gritam.

Só a ciência prova.

Só a mentira é provável.

Só a loucura liberta.

Só a liberdade pesa.

Só o instante existe.

Só a existência é triste.

Só o tempo é humano.

Só a humanidade é tempo.

Só a humanidade é alma.

Só a alma morre.

Só o corpo é eterno.

Só a eternidade vale à pena.

Só a morte redime.

Só a dor desperta.

Só a loucura é sã.

Só a tragédia engrandece.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Pequeno Poema Didático - Mário Quintana (Poema de setembro de 2008)


O tempo é indivisível. Dize,
Qual o sentido do calendário?
Tombam as folhas e fica a árvore,
Contra o vento incerto e vário.

A vida é indivisível. Mesmo
A que se julga mais dispersa
E pertence a um eterno diálogo
A mais inconseqüente conversa.

Todos os poemas são um mesmo poema,
Todos os porres são o mesmo porre,
Não é de uma vez que se morre…
Todas as horas são horas extremas!

Para baixar o poema em áudio, na voz de Antônio Abujamra, clique aqui

domingo, 24 de agosto de 2008

A Cidade


Chega a noite, finda a guerra diária.

É preciso enterrar os mortos, a vida continua

Mais morta que nossos carros.

É hora de erguerem-se, ó sombras!

Mas há alguém que não dorme,

Alguém que, velando, mantêm o real.

Dormir é turvar a realidade,

É encontrar razão no não-ser.

Na noite, onde as leis falham,

Onde a quântica não chega,

Onde “deus está morto”,

Há um homem que vive,

Que chora e que ama

E que olha o mundo

Do alto de um edifício

Por uma janela escura.

Paul Gauguin


Apesar de nascido em Paris, Gauguin viveu os primeiros sete anos de sua vida em Lima, no Peru, para onde seus pais se mudaram após a chegada de Napoleão III ao poder. Seu pai pretendia trabalhar em um jornal da capital peruana e foi o idealizador da viagem. Porém, durante a longa e terrível viagem de navio acabou por ter complicações de saúde e faleceu. Assim, o futuro pintor desembarcou em Lima apenas com sua a mãe e irmã.

Quando voltou para sua cidade natal, França, em 1855, Gauguin estudou em Orléans e, aos 17 anos, ingressou na marinha mercante e correu o mundo. Trabalhou em seguida numa corretora de valores parisiense e, em 1873, casou-se com a dinamarquesa Mette Sophie Gad, com quem teve cinco filhos.

Aos 35 anos, após a quebra da Bolsa de Paris, tomou a decisão mais importante de sua vida: dedicar-se totalmente à pintura. Começou assim uma vida de viagens e boémia, que resultou numa produção artística singular e determinante das vanguardas do século XX. Ao contrário de muitos pintores, não se incorporou ao movimento impressionista da época. Expôs pela primeira vez em 1876. Mas não seria uma vida fácil, tendo atravessado dificuldades econômicas, problemas conjugais, privações e doenças.

Foi então para Copenhagen, onde acabou ocorrendo o rompimento de seu casamento.

Sua obra, longe de poder ser enquadrada em algum movimento, foi tão singular como a de seus amigos Van Gogh ou Paul Cézanne. Apesar disso, é verdade que teve seguidores e que pode ser considerado o fundador do grupo Les Nabis, que, mais do que um conceito artístico, representava uma forma de pensar a pintura como filosofia de vida.

Suas primeiras obras tentavam captar a simplicidade da vida no campo, algo que ele consegue com a aplicação arbitrária das cores, em oposição a qualquer naturalismo, como demonstra o seu famoso Cristo Amarelo. As cores se estendem planas e puras sobre a superfície, quase decorativamente.

O pintor parte para o Taiti, em busca de novos temas, para se libertar dos condicionamentos da Europa. Suas telas surgem carregadas da iconografia exótica do lugar, e não faltam cenas que mostram um erotismo natural, fruto, segundo conhecidos do pintor, de sua paixão pelas nativas. A cor adquire mais preponderância representada pelos vermelhos intensos, amarelos, verdes e violetas.

Morou durante algum tempo em Pont-Aven, na Bretanha, onde sua arte amadureceu. Posteriormente, morou no sul da França, onde conviveu com Vincent van Gogh. Numa viagem à Martinica, em 1887, Gauguin passou a renegar o impressionismo e a empreender o "retorno ao princípio", ou seja, à arte primitivista.

Tinha idéia de voltar ao Taiti, porém não dispunha de recursos financeiros. Com o auxílio de amigos, também artistas, organizou um grande leilão de suas obras. Colocou à venda cerca de 40 peças. A maioria foi comprada pelos próprios amigos de Gauguin, como por exemplo Theo Van Gogh, irmão de Vincent van Gogh, que trabalhava para a Casa Goupil (importante estabelecimento que trabalhava com obras de arte).

Mesmo conseguindo menos de 3 mil francos, em meados de 1891 regressou ao Taiti, onde pintou cerca de uma centena de quadros sobre tipos indígenas, como "Vahiné no te tiare" ("A moça com a flor") e "Mulheres de Taiti", além de executar inúmeras esculturas e escrever um livro, Noa noa.

Quando voltou a Paris, realizou uma exposição individual na galeria de Durand-Ruel, voltou ao Taiti, mas fixou-se definitivamente na ilha Dominique. Nessa fase, criou algumas de suas obras mais importantes, como "De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?", uma tela enorme que sintetiza toda sua pintura, realizada antes de uma frustrada tentativa de suicídio utilizando arsênio.

Em setembro de 1901, transferiu-se para a ilha Hiva Oa, uma das Ilhas Marquesas, onde veio a falecer de sífilis. Fonte (http://pt.wikipedia.org/wiki/Paul_Gauguin)

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Sórdido Ser


Morreu o poeta que tão pouco fez.

Acabou-se o homem, e a sua altivez.

Criou-se o mito, derramou-se o pranto.

Agora veneram-no. Morto, no entanto.

Bob Dylan (Song to Woody)



Uma bela canção dedicada a Woody Guthrie,principal influência de Dylan e um dos gigantes do folk. Uma música simplesmente linda.
Clique aqui para baixar

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Poema Dedicado A Tudo o Que É Sujo


As bananas da Guatemala não são mais

Que a expressão da dor latino-americana.

Como diria o poeta: “Confesso que vivi”.

As bananas são daqui.

E eu, infelizmente sou outro.

E meu coração não suporta mais.

A dor, a dor, a dor da ausência de encanto!

Rogo a Deus que me faça crer Nele!

Comemoro a vida bebendo-a num trago impossível.

Num banquete de merda, um banquete de pura merda.

Assim, deliciar-me-ei.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Releitura (Poema que versa sobre O poema)


Versos fortes sobre um papel frágil,

A caligrafia trêmula regida por uma mão hesitante.

Sob meus olhos, então: um poema. Poema?

Tabacaria não é um poema, é uma vida.

Como pôde Campos não se consumir nessa obra?

Como pôde ser tão forte?

Releio com atenção cada verso.

É uma vida.

A poesia não suporta mais tal grandeza.

Versos capazes de dilacerar.

Por fim fecho o livro e vou até a janela:

Ninguém acena para mim,

Meu universo não se reconstrói.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Bach - Concerto de Brandenburgo Nº1, 2º Movimento


Bach, mais uma vez Bach, segundo movimento do primeiro concerto de Brandenburgo.
Clique Aqui para baixar.

Sobre os Homens


Canto, por meio de uma voz emancipada,

Canções que dizem que não existo.

Tudo o que faço (ou penso fazer?),

Já não faz parte de mim.

“Que sou eu então?”,

A poesia pergunta.

A realidade se cala e olha para o chão.

Tudo o que nos forma já não é nosso.

As vozes emancipadas se calam

Ao chegar ao fundo do frio abismo do silêncio.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008


É com a verdade que tu sonhas menina?

É da verdade que tu dizes tais palavras?

Estás certa que não é de um sonho?

Não seria onírico o teu precioso mundo,

De verdade ocultada por uma sombra de transcendência

Onde os homens se freqüentam por serem simplesmente o que são,

E por nenhuma outra verdade mundana,

Por nenhum outro comércio de idéias?


É menina, eu já a algum tempo já não me faço outra coisa a não ser suicidar-me

Pela dor que, de ser homem se transforma em mercadoria

Por acaso seria do mesmo pão de que se alimentam lebre e lobo?

Por acaso seria o mesmo o papel do rei e do bobo?


Mas, é com infelicidade que digo,

Que há de existir sempre bobos

Que as lebres valerão menos que lobos,

E que homem há de sempre ser uma mercadoria,

Uma mercadoria metafisicamente simples.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Incandescente Desejo


Quisera eu descrever ti em um poema.
Pois sei que palavras me faltariam para descrever tal obra de arte.
Pois tu és um poema em pessoa com toda graça e formosura.
Vós domastes o meu coração, tu foste à loucura da minha inspiração.
Sonhei com o teu belo olhar sereno quão belo como o luar que paira sobre o mar.
Sonhei com a tua voz marcante, que ecoa no meu peito a todo estante.
Sonhei com o teu rosto que minha mente nunca será apagado.
Sonhei com o teu corpo que por mim sempre será desejado.


***


Quisera eu, meu anjo te re-desenhar em luas novas de Sodoma.
Enlaçar-te em meus braços como um fulgaz sentido.
De um sonho já vivido em um pleno amor correspondido.
Onde o teu olhar me evoca a te amar por duas vidas passadas a mais.
Contemplar tua face resplandecente do veneno da paixão
Desejar teus beijos em sede de necessitar de tua vida a me completar
Cultuar teu corpo pela luxuria cega de te desejar por inteiro
Amar-te em um simples sentido de ser humana e anjo por ser tua.

***
Por Marcelo Bastos & Sophia de La Boetie

O Poema do Mês, "Tabacaria", em áudio


Para quem quiser conferir o poema tabacaria em áudio mp3, na inconfundível voz de Antônio Abujamra.
Clique Aqui para baixar.

domingo, 3 de agosto de 2008

Transe


Dedicado a Glauber Rocha e sua

Solitária alma inquieta.

No alto desta noite escura e triste

Estendo meu frágil corpo

Sob um luar disperso em nuvens negras.

Bebo inconstância nas amargas fontes da razão

E me entrego à incerteza do tudo e do nada.

Adormeço e acordo mil vezes a cada segundo

Sem perceber a fria ausência da morte em mim,

Perdôo-me por não pensar a ausente e parto enfim,

Para afogar-me no solitário transe das almas inquietas.